terça-feira, 10 de julho de 2007

VIVER VALE A PENA!



Seja quem for que tentar um levantamento estatístico da própria vida, com certeza não irá gostar muito da análise dos resultados. Com toda a certeza, e a partir dos dados coletados, descobrirá que a parte maior do gráfico circunferencial do tempo vivivo– aquele que parece um queijo de onde foi cortado um pedaço- pertence aos acontecimentos desagradáveis, ou tristes, ou violentos ou insuportavelmente chatos.

Uma pessoa simpática por exemplo, daquelas que dão prazer e nos deixam felizes mesmo que por pouco tempo, equivale a pelos menos trinta ou quarenta manés; cinco “bichos-grilos”; dois gerentes de banco; um cunhado insuportável; seis ou sete cobradores; um ou dois invejosos e um guarda de banco que faz aquele terrível sinal de negativo quando você chega dois minutos atrasados.

Um lugar ou ambiente agradável, do tipo que deixa a gente na mais deliciosa sensação de conforto, corresponde a no mínimo a vinte intermináveis filas.
Seis extremamente irritantes salas de espera.
Um bar com um copo de chopp derramado na roupa nova, onde você paga um couvert artístico caríssimo pra ouvir “O bêbado e o equilibrista”, vindo de um violãozinho desagradavelmente alto, acompanhado por uma voz esganiçada e um prato de óleo frito na batata.
Um shopping onde o acompanhante quer pelo menos ser visto babando na frente de uma griffe importada.
Uma noitada de pagode onde o cantor pode muito bem mudar a letra do samba, xingar a sua mãe, que você não ouve e continua dançando.

Por um e-mail interessante, gostoso de ler e vindo de quem você mais espera?
Inúmeros redirecionados de gente desconhecida.
Incontáveis spams e ainda aquelas mensagens impessoais e de mau gosto acompanhadas de vírus.
Por um telefonema “daquela” voz sensual e impressionantemente excitante?
Chatos de toda espécie, tentativas de aproximação desnecessárias, ligações irritantes pedindo pra pressionar a tecla um, dois , quatro ou cinco, de acordo com a sua classificação pessoal em relação à empresa com a qual você fala. Nunca vi um para cobrança. Tipo: aperte a tecla 4 e você falará diretamente com o nosso departamento de contas a pagar.

Parece que tudo o que é bom na vida tem um preço. Preço alto. Caro. Mas que é preciso ser pago em uma troca justa. Afinal, a sensação de vingança de um não bem aplicado, vale um mês de irritação daquele chefe rejeitado para um jantar a dois à luz de velas.

E o que dizer dos garçons, lixeiros, guardas noturnos, coveiros e outros desafetos da vida, que pingam no copo da esperança uma pequena parte dos seus salários para se sentirem reis, baianas, índias e enfeites de carros alegóricos em apenas um dia de desfile de escola de samba?
Boa troca.
E o que dizer da vendedora de balcão que comercializa caríssimas peças de roupa e deixa na mesma loja um mês inteiro de salário só pelo
prazer de ser elogiada pelo namorado?
Troca justa.
E a prestação do automóvel que engole de uma só bocada a maior parte do ganho mensal, deixando o resto pro tanque de gasolina?
Bom negócio.
E quanto a ser Brasileiro e conviver ao mesmo tempo com gente honesta e políticos, lixões chamados Brasília e cenários delirantemente belos?
Dá pra pensar.
E aqui é preciso citar Chico Buarque de Hollanda:” Luz, quero luz Sei que além das cortinas são palcos azuis E infinitas cortinas com palcos atrás arranca, vida estufa, veia e pulsa, pulsa, pulsa, pulsa, pulsa maisMais, quero mais nem que todos os barcos recolham ao cais, que os faróis da costeira me lancem sinais .Arranca, vida Estufa, vela Me leva, leva longe, Longe, leva mais...”E ainda é preciso citar Chico Buarque de Hollanda:” Pode ir armando o coreto e preparando aquele feijão preto eu tô voltando. Põe meia dúzia de brahma prá gelar, muda a roupa de cama eu tô voltando. Leva o chinelo prá sala de jantar que é lá mesmo que a mala eu vou largar, quero te abraçar, pode se perfumar porque eu tô voltando ” ( Favor ler o texto cantando a música, a emoção é bem mais significativa).

Ah! doce felicidade.Grande, média, pequena ou insignificante. Qualquer pedaço de você me serve.Que seja na forma de um trote telefônico. Um telegrama com duas palavras: te amo. Uma xícara de café na cama. Um biquíni que sem querer se solta do corpo daquela morena densa e profunda. Uma rede. Um emprego honesto. O desaparecimento do Gugu Liberato. A liberdade de um filho preso. O sorriso de alegria de uma criança que recebe uma minúscula bonequinha de plástico no dia de natal. Ou o do dono de um “quarto com banheiro” quando enfim a gente consegue pagar quatro meses de aluguéis atrasados.

A felicidade Brasileira é uma das mais caras do mundo.E mesmo assim, em meio as diferenças sociais, a podridão, a lama e a indiferença, a brava gente Brasileira paga. E paga com um sorriso rasgado no rosto.Sorrisos enegrecidos de cáries, que enrugam os olhos maltratados pela desesperança, como obras de arte emolduradas pelo sofrimento.Felicidade onerosa, que, se custasse um pouquinho menos, estaria presente na mesa, na saúde e na educação de nossa gente.Diz aí Paulinho da Viola: “...mas é preciso viver, e viver não é brincadeira não...”Diz aí Chico : “...a gente vai levando”Viver vale apena.

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