sábado, 31 de maio de 2008

O MURRO




È realmente impressionante o numero de surras que a vida reserva para a maioria dos viventes desse novo orgulho da economia mundial chamado Brasil. Acho que é por isso que todo mundo nasce chorando e para começar a viver tem que pagar com a dor do primeiro tapa. Digo o primeiro de inúmeros. E tantos, que se fossemos informados dessa dolorida conta, talvez preferíssemos não nascer e fazer a viagem de retorno sem ao menos colocar os pés nas terras do nosso destino em vida. E somos tantos a apanhar diuturnamente que já nos tornamos sem-vergonhas, como cachorros que lambem as mãos que prendem nossos pescoços com coleiras.
A minha mãe, por exemplo, leva um sôco diariamente quanto acompanha pelo site da Justiça Federal a paga justa dos mais de 40 anos de trabalho do meu pai, a quem o INSS insiste em tratar como vagabundo, enchendo todo o processo com recursos procrastinadores. E ela é apenas mais uma dessa fila imensa de injustiçados, que apanham impiedosamente por requerer os direitos da lei, negados por uma justiça meio cega e que só enxerga os planos superiores da bem-aventurança social.


Neste grande Brasil quase potência, 90% de toda a população acorda para uma sova diária, que começa na ausência da alimentação digna, segue pelo transporte público desumano, no sacolejo de ruas poeirentas e esburacadas e termina na estafa do subemprego, do subsalário e da sub vida. De almoço, as vezes, apenas uma marmita fria que apenas se presta pra manter a vida no limite mínimo de suas necessidades básicas.


E tome surras. Bofetadas nas filas da insalubre saúde pública. Safanões da guarda armada para lhes dar proteção. Baculejos por andar maltrapilho. Enfrentamentos por exigir direitos em manifestações públicas. Escárnio por reclamar de tarifas, taxas, impostos e outras cobranças que compõem o imenso assalto ao também sovado bolso de todos os Brasileiros. Empurrões em quem se atreve a reclamar da cotidiana punga ao dinheiro que deveria servir para melhorar a vida de todas. Tapas ardidos da falsidade da auto defesa, praticada por quem vem a pública jurar inocência, mesmo com provas materiais e indiscutíveis da culpa.


E a taca começa cedo. Na gravidez desamparada. Na infância mal assistida e doída da pobreza. Na escola que não atinge seus grandiosos objetivos por absoluta falta de recursos. Na depressão de um corpo docente cuja força vem do senso de humanidade, mas que sem amparo, pouco pode fazer por gerações e gerações do nosso futuro. E tome surra.


A gente acorda apanhando, passa o dia apanhando e chega em casa apanhando. Enquanto isso o mundo fica maravilhado com nossas exportações. E nos eleva à condição de potência emergente. Como se todos vivêssemos essas benesses. Como se nossa gente não sofresse o pão que o diabo amassa com o sovaco, para que apenas 10% de todos os Brasileiros usufruam desse imenso esforço.


E ontem todos tomamos mais um soco. Aliás dois. U’a mãe foi chamada de puta e um jornalista foi surrado. Bobagem. Um tabefe a mais ou a menos não faz a menor diferença.


E a sabedoria diz que devemos dar a outra face. Eu não dou.

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