domingo, 22 de fevereiro de 2009

A CONTRA-INTELIGÊNCIA


Não faz muito tempo que Caetano Veloso reclamou dos altos preços cobrados pelos ingressos de um show realizado – se muito não me engano – em Goiânia. Achei incrível isso, mas é uma pena que essa história tenha outros ingredientes. A realidade é que a empresa responsável pelo evento agiu assim para combater a verdadeira indústria de carteiras de estudante, que, na forma de um estelionato brando, tenta invadir espetáculos de produção onerosa com documentos falsos, expondo o caráter da vida Brasileira nos atos mais simples.

E foi assim que a receita conseguiu se equilibrar com a despesa e proporcionar algum lucro. E a conta é fácil de ser feita. Basta imaginar um ingresso originalmente sendo vendido a cem reais e o resultado seria o de uma platéia lotada de falsos estudantes pagando apenas metade desse valor. Pronto. Está criada a inteligência do preço absurdo e a contra-inteligência do “jeitinho Brasileiro” que faz verdadeiros malabarismos para se livrar da antiga prática de lucrar muito oferecendo pouco, para encher as burras rapidamente.

Esse é o verdadeiro sonho do Brasil.

Sonho dos poderes. Sonho da iniciativa privada. Sonho do povo. Sonho de tirar vantagem de tudo, que, pouco a pouco, foi criando a imagem de um povo afeito a toda espécie de malandragem, em um mar de safadezas em que todos estamos mergulhados.
E tome safadeza.

Na pirataria que se contrapõe aos preços absurdos cobrados por obras de arte, na sonegação de impostos que retira a carne do capital empresarial da bocarra imensa de um leão fiscal faminto, nas concorrências direcionadas, na contratação dos comissionados de gabinetes políticos e por aí afora. Conheço gente que leva a mãe para furar fila dos bancos, na contra-inteligência que luta desesperadamente para se livrar do desrespeito das instituições financeiras.

Na verdade, a maioria das ações movidas contra as empresas de telefonia é duvidosa. Há notícias de que os valores cobrados estão certos, mas o brasileiro, aproveitando a maré de raiva vinda do péssimo serviço e das taxas desconectadas da realidade, não perde tempo em contestá-los na justiça em milhares de ações que buscam ressarcimento da ladroagem generalizada.

E assim vamos vivendo a dura realidade da inteligência pequena, mesquinha e idiota, que nos dá a todos a fama da pilantragem já reconhecida internacionalmente. Pilantragem dos atestados médicos sem doenças. Pilantragem dos remédios diminuídos dos seus princípios ativos. Pilantragem das propinas que subvertem a lei e outras e infinitamente outras.

Uma simples pizza cujos ingredientes básicos custam cinco reais não pode ser vendida por menos de vinte e cinco. O preço indigesto vem dos sabores amargos acrescidos às suas delicias. Encargos sociais da mão de obra, taxas municipais, energia elétrica com preços altíssimos e ainda cerca de 40% que vai diretamente para a pança insaciável da Receita Federal.

Não há como, honestamente, baixar o preço praticado. Desonestamente sim. Basta adquirir cargas roubadas, comprar matéria prima de origem duvidosa, negligenciar com insumos de higiene e ainda pagar salários miseráveis no escravismo sutil do trabalhador, que come para se manter vivo e poder trabalhar para comer de novo.

No fundo, a contra-inteligência que reage ao absurdo da vida no Brasil, merece, à luz dos princípios de humanidade, algum perdão. Tirando da lista a politicagem suja, que põe no bolso o dinheiro das mínimas necessidades de uma vida digna, o resto merece um pouco de condescendência.

Não é bandidagem. Não é safadeza. A “contra-inteligência” Brasileira é pura sobreviência.

2 comentários:

Anônimo disse...

Que bacana essa crônica, gostei mesmo !!!

Anônimo disse...

Essa contra inteligencia é a velha amiga , só não tinha nome. Gostei !!! Bj