sábado, 21 de fevereiro de 2009

Insulfilm


Uma das grandes invenções do conforto e da safadeza moderna é uma película muito conhecida e chamada de insulfilm. Trata-se de uma fina camada de poliéster coberta exteriormente por metal e que se presta tanto para diminuir a claridade ambiente, quanto para minimizar o calor dos raios solares. Beleza de invenção, não fosse pelo uso as vezes não muito que a malícia humana sempre reinventa para outros propósitos.

E isso fica claríssimo nos automóveis balançantes parados nas esquinas, na condução da mulher do próximo ou na invisibilidade que a promiscuidade ou a pedofilia precisam, quando estacionam em lugares escuros ou entram nos motéis da cidade.

Mas não para por aí. Essa já disseminada prática, que hoje faz parte da quase totalidade dos automóveis que circulam por nossas ruas, também se presta para acobertar o deslocamento da marginalidade, criando uma barreira na visibilidade da vigília policial, que raramente consegue visualizar a bandidagem circulando livremente pelas ruas.

Entre o povo e o poder isso também acontece. Um insulfilm imaginário existe exatamente com essa finalidade. Com ele, a visão de quem paga impostos, na tentativa vã de contribuir para a melhoria da vida de todos, não vai muito longe. Aqui e ali o jornalismo decente e a fiscalização feita por homens honestos, conseguem perceber apenas movimentações estranhas nas salas refrigeradas de todos os poderes, sem que as verdades de todas as maquinações possam ser vistas com clareza.

E esse é o outro lado do nosso insulfilm imaginário. A verdade clara e indiscutível de que nada jamais possa ser visualizado em alta definição, com minúcias de detalhes, para não provocar indignações ou perturbações da ordem pública, hoje já claramente em ebulição.

E assim lá vamos nós nos dois únicos cômodos existentes na grande casa da democracia Brasileira. De um lado - sofrendo as agruras do trabalho forçado; em regime de semi-escravidão; sem educação sem saúde; sem segurança e exposto à sanha capitalista do mercado de capitais e do grande e idolatrado deus pagão chamado mercado - todo um povo. Cômodo miserável, insalubre, distante e cujo único enfeite é o arroz, o feijão e a farinha vindos da esmola pública. Um quintal da civilização, onde se convive com ratos, baratas e doenças de todas as espécies.

No outro cômodo mora a felicidade. Felicidade fresca e aclimatada com ar condicionado e todas as mordomias imagináveis e inimagináveis. Cartões corporativos. Viagens pagas com o dinheiro do povo. Mulheres. Bebidas. E o lucro de todos os conchavos e proveitos duvidosos que o poder permite.

No meio a famigerada barreira. O insulfilm que vela a visão dos dois lados. A do povo, sem visibilidade nenhuma sobre a farra feita em nome do seu suado dinheiro, e a do poder, que assim fica livre de ver a nojentice da miséria.

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